A jurisprudência atual sobre a responsabilidade estatal por omissão
- Postado por IPMagis
- Data 10 de outubro de 2021
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Há muitos anos, o STF entende que os danos causados por condutas omissivas estatais atraem a regra da responsabilidade civil subjetiva (v. RE 179.147/SP), porém, em 2016, ao decidir um caso que envolvia o suicídio de um detento, firmou a seguinte tese em sede de repercussão geral (Tema 592 – RE 841.526/RS):
“Em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no art. 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte de detento”.
Será que esse julgado representa uma viragem na jurisprudência do Pretório Excelso? A responsabilidade do Estado por danos provocados por omissão ainda seria subjetiva, conforme a tradicional lição de Celso Antonio Bandeira de Mello
Sem delongas, insta afirmar que, em regra, a responsabilidade das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos por ato omissivo segue a teoria subjetiva.
No entanto, tal regra comporta exceção nos casos em que o Estado tenha deixado de agir quando sobre ele recaía dever legal específico para atuar. Nessa hipótese, adota-se a responsabilidade objetiva.
Para ilustrar, calha usar o exemplo dos processos que envolvem morte de pessoas sob custódia do Estado.
Se o detento vem a falecer no interior das dependências de um presídio, em circunstâncias fáticas que indicam que o Estado deixou de atuar para evitar o resultado morte, por exemplo, abstendo-se de fornecer tratamento médico ou não impedindo briga entre presos, desponta patente violação de dever específico esculpido no art. 5º, XLIX, da Constituição Federal, e a responsabilidade estatal é de natureza objetiva.
Em suma, o Estado responde objetivamente pelos resultados danosos advindos de sua omissão legal específica em impedir a ocorrência do dano, vale dizer, quando este é consequência da inércia diante de um dever individualizado (específico) de agir.
Naturalmente, no esteio da teoria do risco administrativo, compete ao Estado comprovar a ocorrência de alguma das excludentes da responsabilidade estatal.
Por exemplo, o Estado poderia afastar a responsabilidade caso lograsse demonstrar a culpa exclusiva da vítima, se comprovasse que, nas palavras do Ministro Luiz Fux, Relator do RE 841.526/RS, o suicídio foi “um ato repentino e isolado, praticado num momento fugaz de angústia exacerbada e absolutamente imprevisível ao mais atento carcereiro, médico ou até mesmo aos mais próximos entes queridos do falecido”.
Nesse cenário, o nexo causal estaria rompido, de modo que a responsabilização do Estado corresponderia à adoção da teoria do risco integral, nos termos estampados na ementa do julgado citado.
Por outro lado, se o suicídio do detento era previsível “à luz do seu histórico carcerário”, emerge a responsabilidade estatal pela inércia em atuar para evitar o resultado por meio de, a título de exemplo, oferecimento de tratamento psiquiátrico adequado, desde que demonstrada a possibilidade efetiva de agir para obstar o resultado danoso.
Como ponderou o STF nesse julgamento, para reconhecer a responsabilidade do Estado é necessária inobservância do dever específico de proteção, caso contrário estar-se-ia aplicando a teoria do risco integral.
Tenha-se presente que o STJ, por sua vez, tem jurisprudência consolidada no sentido que “o Estado responde objetivamente pelo suicídio de preso ocorrido no interior de estabelecimento prisional”, pois o Estado tem um dever de vigilância e segurança e sobre os presos (AgRg no AREsp 528911 / MA).
Jurisprudência Selecionada
- STF – RE 841526/RS
- STJ - AREsp 1717869/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/10/2020, DJe 01/12/2020.
- TJSC - Apelação Cível n. 0015064-70.2011.8.24.0018, de Chapecó, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 29-09-2020.
Bibliografia
- DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 33ª edição. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2020.
- MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo. 11ª edição. São Paulo: Saraiva, 2021.
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